sexta-feira, novembro 18, 2005

Na minha cadeira


Aos poucos vou banindo a solidão. Que não me assusta.
Hoje sou quem eu quiser. Hoje vou-me inventar e ser quem sempre desejei.
A vida é uma grande sedução, onde tudo o que se escreve seduz. Tudo o que existe seduz...E hoje posso ser seduzida ou seduzir.
Se me deixar ficar presa ao que não quero fico sem mãos para contar a aventura que é imaginar a vida que vivi. E festejar o que construí.
Hoje quero ser mar. Azul cobalto, para condizer com o teu sangue real.
Quero ser sol, para aquecer todas as noites frias de outono a cair em nós.
Quero ser céu para cobrir todos os sonhos de todos os mundos de todos os tempos.
Quero pedir desculpa por não ser disponível. Por não dar atenção ao que merece ser ouvido.Mas A Catadupa de acontecimentos não me deixa espaço para tudo o que também merece...E sinto-me louca a beber tudo ao mesmo tempo, com medo de não poder ter tudo. De não saber ver tudo.
Corro sem saber para onde e sem me importar por não saber.
É assim. Temos que sofrer não só pelos nossos próprios pecados e omissões, como também pelos pecados dos outros, pelos pecados do passado.
Ouvi de novo a música, vivi de novo aquelas horas de espera. E senti que a música faz esquecer. A música faz esquecer completamente a literatura. E até a vida. A música é um sedativo. Torna-nos contemplativos. Faz-nos sonhar. É bonita, a tua música. É como se me tivesse drogado. Puxa ao sentimento. Não a letra, quase imperceptível, mas a melodia, a batida suave, a mistura de fado com Rui Veloso. Mais fado. A sedução, o feitiço!
Posso quase espremer dela um pouco do teu ar envergonhado...
Faço viagens aqui sentada! A cadeira devia ser mudada. Devia ser mais confortável, mas não mudo para me auto flagelar e manter-me acordada enquanto percorro as ruas mais íntimas em mim.. As minhas ruas batidas pelos meus saltos de sete centímetros.
Nessas ruas mora gente. Gente que procuro descobrir e sentir. Gente que faz os meus dias e noites. Gente que vai e vem. E enquanto lá morar alguém, vou continuar a percorrê-las. Vou andar á descoberta de tudo o que vivem e como vivem. Á procura de mim. De alguma maneira espelho-me nessas vidas, e descubro tudo o que quero saber a meu repeito. Pessoas diferentes que me fazem diferente. Inteligentes, ou não. Ruidosas, ou não. Sonhadoras, todas. Sempre á espera. Olho-as e ouço-as. Falo e falo e falo, mas gosto tanto de ouvir! E sobretudo perceber. Olhar lá bem para dentro. Para dentro de cada uma das casas por onde passo e deixo uma marca mais ou menos legível, mais ou menos discreta. A minha marca mais ou menos marcante. As janelas vão-se abrindo e fechando e por vezes voltando a abrir. Outra vezes ficam fechadas para não lhes descobrir os segredos. O medo assalta-nos a todos. Por vezes sou o lobo mau que se entranha nas cozinhas e prepara a mais suculenta das refeições. Muitas vezes fica tudo no prato. Outras vezes fica por servir, até. Mas preparo tudo com esmero e alegria e tento alimentar as almas famintas.


Ás vezes sou comida e gosto. Outras vezes não. Também me instalo nessas casas, sem vontade de sair. Mas saio, porque a solidão não me assusta. E tudo cicatriza. E posso sempre voltar para ver a vida dessas casas através de uma janela meio aberta.
As minhas viagens e aventuras sentada nesta cadeira!

Conversas, sentimentos nunca explorados até ao limite. Para ficar alguma coisa para a próxima viagem...
Para não matar o mistério com uma única machadada.
Viajo á toa, conforme o vento...


E vou andando pelas ruas, destruindo o lixo depositado. A reciclar os restos. Nem sempre uso o machado. Reciclar é uma boa escolha. Porque o passado não se apaga. Cola-se e não desiste, até essa limpeza estar concluída. Limpo as mágoas, os mal entendidos, as feridas. E saio para outra rua mais leve, e do cimo dos sete centímetros vejo tudo menos sombrio.
Vejo a luz. Um ponto que me vai indicando o caminho. A estrela do norte que tenho a guiar-me sempre presente. Uma estrela que brilha mais que as outras... Mãe! Da minha cadeira também te vejo!
Viajo por dentro de mim e vejo-te a ti! Vivo por ti, também.
> Blogger Mary Mary said...

E é tão bom fazer essas viagens! Sonhar, viver, aprender, chorar, sorrir... Sem fingimentos! Apenas puro...

sexta-feira, novembro 18, 2005 12:44:00 da tarde  
> Blogger Ossos said...

Obrigada, noon-e... E desculpa! Desculpa! Desculpa! Voltas? Não sei quem és... mas espero que voltes... Sem pedir definições.

segunda-feira, novembro 21, 2005 9:46:00 da tarde  
> Blogger cvarao said...

miúda, conheci o teu blog atravésde um amigo meu... os teus post comovem-me imenso mesmo... tenho que passar a converter os meus desabafos no blog, mais do que frustrações...
CV

quinta-feira, novembro 24, 2005 2:22:00 da tarde  
> Blogger Ossos said...

Catarina, volta sempre que quiseres. Obrigada pela visita. E quem é esse teu amigo? Misterioso, ou não? Beijos

quinta-feira, novembro 24, 2005 6:07:00 da tarde  

Enviar um comentário